Apenas por pessoas de alma já formada

quarta-feira, 31 de março de 2010

O outro (lado da moeda)

Seu corpo chegou à sua porta ensanguentado, com feridas por todo lado. Sua pele ressecada. Ela estava desacordada e trazia junto de si uma taça com um líquido amarelado. Havia um bilhete também que dizia: caso queira ter a mesma morte que ela. De repente, perdeu o fôlego. Não quis acreditar nas palavras lidas, nem na imagem à sua frente. Não, ela não podia estar morta. Ele não podia tê-la matado. Uma lágrima de seus olhos escorreu. Tentou acordá-la. Ela só podia estar desmaiada. Então, sacudiu seu corpo, derrubando a taça com o líquido envenenado no chão. Não. Não. Pois estava. Não ouviu uma pulsação sequer. Sim, ele, aquele homem tirânico que um dia já havia amado sua amada, a matara. "Caso queira ter a mesma morte que ela." Só podia ser brincadeira. Ele não se safaria assim facilmente. O jovem rapaz que perdeu sua amada podia até morrer, mas mataria o homem tirânico primeiro. Nem que isso fosse a última coisa que faria em vida.
(continua)
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terça-feira, 23 de março de 2010

Para todo fim, um começo

"Você sabe que nós podemos continuar amigos." Ele tentava absorver as palavras daquela a quem já amara tanto. Ela só podia estar brincando. Amigos? Nem em um milhão de anos! Não depois do que ela fizera a ele.
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A raiva contaminava aos poucos suas veias. Precisava expelí-la. Sua mente maquiavélica, então, lhe mostrou a solução.
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O rapaz de coração recentemente ferido pensou rápido com o veneno que sempre carregava no bolso para momentos de emergência. Aquela era uma emergência.
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"Façamos um brinde, então", disse ele, erguendo automaticamente as taças cheias da bebida envenenada. Ela se assustou com seu sorriso dissimulado. Ele parecia louco de ciúmes e raiva, mas não recusou o brinde dele, pois já havia recusado seu coração.
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Pegou a taça, sem titubear e deu o primeiro gole. "Um brinde à nossa futura amizade. Sem maiores rancores.", ela cuspiu as palavras e logo depois sentiu o gosto amargo descer por sua garganta. Achou estranho, mas nunca era agradável a ela nenhum tipo de bebida alcóolica, então não questionou o gosto.
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E ele não sentiu remorso. O sabor da vingança tomava sua boca. Era maravilhosamente gostoso. Como voltar atrás assim? Não sentiu remorso, mas lamentou o fato de que provavelmente não estaria ao seu lado para vê-la falecer. O veneno atua lentamente para o sofrimento ser o maior possível. Ela estaria longe dali quando sua cara traíra batesse no chão, machucando o corpo já morto.
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Ele não estaria ao seu lado, mas daria um jeito de estar. E o outro por quem ela o trocou também teria seu papel no plano maquiavélico que seu coração magoado arquitetara.

(continua)
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quinta-feira, 18 de março de 2010

Deserto árido

Ela andava como se uma de suas pernas estivesse quebrada e fosse assim incapaz de ajudá-la a se locomover. Caminhava como se arrastasse o membro incapacitado e tinha uma dor no rosto. Rosto de quem sofre. Ela estava prestes a cair. Lutava para continuar em pé. A face suja. Cabelos soltos cobriam seus olhos. Ela olhava para baixo enquanto caminhava, meio corcunda, como se pesasse algo em si. Andava como se carregasse o peso do mundo. Ela definitivamente estava prestes a cair. Seu joelho direito sangrava. Talvez, estivesse realmente com uma das pernas quebrada. Precisava de ajuda, mas não havia ninguém por perto para ajudá-la e ela não sabia o que fazer para curar aquelas feridas abertas que precisavam de pontos para cicatrizar. Provavelmente não cicatrizariam nunca. Como doía caminhar! Ela sabia que se caísse não seria capaz de se levantar. Não mais uma vez. Seria demais para ela tentar uma segunda vez. Praticamente não tinha mais força alguma. O calor incessante do deserto árido. Sua boca seca estava mais branca do que sua pele, que de branca não tinha mais nada. O sol tostava a epiderme. Ela estava em um vermelho de quem está prestes a obter uma ensolação. Os lábios rachados, a pele ardida, os cabelos queimados, a perna dolorida, o corpo cansado, prestes a sucumbir. Ela não podia desistir, mas já não tinha mais forças. Começava a delirar. Via um oásis à sua frente e um rapaz lhe esperando de braços abertos, logo no exato momento em que seu corpo cedeu. Ele a segurou com um abraço. Ela não agradeceu. Apenas uma palavra veio à sua mente e foi o que disse a ele: "Água", apontando para o rio atrás deles. O rio sumiu. Sua alucinação desapareceu. Mas o rapaz era real. Ele continuava segurando-a nos braços. "Eu estou morrendo, não estou?", ela falou ofegante suas últimas palavras. Ele não respondeu. Apenas molhou seus lábios. Lábios tão lindos não deveriam morrer daquele jeito. Ele disse, logo após o intenso beijo, ao qual ela correspondeu: "É apenas um sonho. Logo tudo passa." Ele sussurrou as palavras em seu ouvido. Ela enfim, faleceu e ele sorriu. Aquele em quem batera nunca mais a teria.
(continua)
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sexta-feira, 5 de março de 2010

Pesadelo

Ele sonhava todas as noites com o mesmo pesadelo. Aquele mesmo que o fazia acordar molhado de tanto suar, contorcendo-se na cama como uma criança clamando por ajuda. Faça a dor parar!
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Ele se arrumava impecavelmente. Colocava seu melhor paletó. Esperava por ela. Ela aparecia com uma mala na mão e um sorriso forçado no rosto. Eu vou voltar. Ele, de repente, não era mais ele. Era uma criança pequena, com lágrimas nos olhos. Por que você não quer me levar? Você não me ama? Mamãe, por que você não me quer mais? A criança se sentia como aquele mesmo brinquedo que teve que abandonar alguns anos atrás por não prestar mais. Estava quebrado e não servia mais para brincar. Agora era ele que estava quebrado também? Por isso ela o abandonava? Agora quem chorava era ela. Ela também chorava. Mamãe, por que você chora? Você se machucou? Também está sentindo a mesma dor no peito que eu agora sinto? Mamãe, fala comigo! Não me deixa aqui. Ela limpou as lágrimas do rosto e pediu para ele se arrumar. Ok. Você vai comigo, meu amor. Mas tem que trocar de roupa. Mamãe está toda arrumada, vê? Você também tem que estar. Não tenha pressa. Eu lhe espero. Eu não vou a lugar algum sem você. Ele sorriu. Iria embora com ela. Não importava para onde. Ele iria com ela. Ele se arrumou rápido, mas caprichosamente. Tinha que estar tão arrumado quanto sua mãe. Tão lindo quanto ela estava! De repente, voltou, gritando, preocupado. Mamãe, eu também tenho que levar minhas coisas! Meus brinquedos! E agora? Tem espaço na sua mala? Era uma criança. Para ele não importava roupas, mas, sim, seus brinquedos. Mamãe? Onde tem outra mala? Mamãe? Ela não estava mais na sala. Partiu. Sem ele. Eu não vou a lugar algum sem você. Pois foi. Aproveitou sua distração e saiu escondida, para bem longe dali. E ele correu. Tentou achá-la. Foi para a rua. Chorava, soluçava, gritava. Mamãe! Um carro quase o acertou. Crianças não lembram que tem que olhar para os lados antes de atravessar a rua. Ele só queria encontrá-la. A cena, de repente, rebobina. Volta no tempo. Ele não é mais a criança abandonada pela mãe. Ele é o mesmo adulto de hoje. Arrumado com seu melhor paletó. Esperando por uma mulher. Ela aparece com uma mala na mão. A mesma mulher. Ou outra diferente. Não importa. O que ele quer é a mala. Não ela. Ele corre desesperadamente em direção a ela. Tenta entrar na mala que ela segura em suas mãos, mas não consegue. Ela é muito pequena para ele que é tão grande. Se ao menos ainda fosse a criança de alguns minutos atrás, bastaria jogar as roupas que facilmente entraria. Aquela mala não levava nada dentro, mas ainda assim não o suportava. A mulher, então, gritava. Não dá! Não adianta tentar! Mas ele não a ouvia. Tem que dar! Eu tenho que entrar! Eu não posso ser abandonado novamente! E, de repente, ele abria os olhos. Acordava do pesadelo com o corpo suado. Suas roupas molhadas.
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Ele sentia a mesma dor no peito que a criança mencionou. Nem vestido com seu melhor paletó, ela o quis. Nem deu tempo de dizer nada a ela. Talvez já esperasse o que sempre ocorria. Ela sempre o abandonava, mesmo vestido com seu melhor traje. Ele não foi o bastante para ela. Sabia disso. Estava quebrado. Era igual ao brinquedo quebrado que abandonara quando criança. Independente do que fazia, ela sempre partia sozinha. Por que você não quer me levar? Você não me ama? Mamãe, por que você não me quer mais?
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E ela chorava todos os dias. O mesmo pesadelo que o atormentava também a dilacerava. Ela também o tinha todas as noites e mesmo assim nunca voltara para pedir perdão. Ela não o merecera. Ela o enganou. Traumatizou seu coração. Ela não nasceu para ser mãe.
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quinta-feira, 4 de março de 2010

Doce verão

Minha semana não é mais a mesma. Todos os dias são um só. O mais triste de todos. Uma segunda multiplicada por sete. Todos os dias são como uma triste segunda-feira. Você foi um alegre final de semana e agora eu tenho que lidar diariamente com uma depressiva segunda-feira. Você foi o cintilante e perfeito verão da minha vida e eu não quero passar por esse inverno que mata todas as lembranças alegres que eu e você tivemos juntos. Por que nosso verão teve que acabar?
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quarta-feira, 3 de março de 2010

Acabou

Como seu coração podia ter diminuído daquela forma? A angústia não inflava seu coração como a felicidade normalmente fazia. Não, seu coração dessa vez se contraía cada vez mais. Apertado ele estava. Como você pode ter feito isso a ela? Diz que não. Diz que odeia. Diz que não importa da mesma maneira que antes, mas não fica calado. Não faça com que a esperança tome conta dela, mesmo sabendo que, se você não disse nada, é porque não quer mais. Ainda assim. A esperança não percebe isso e faz com que ela sinta (ainda) que a qualquer minuto aquele telefone irá tocar e será você a ligar. Ela queria encher a cara e fugir desse mundo, mas ela não bebia. O tempo começava a fechar e ela sabia que não aguentaria muito tempo. Ela também despejaria rios de água em poucos momentos. Não iria demorar. As forças se esvaiam e ela realmente começava a se fechar para o mundo. Armava uma caixa de aço que impediria ela própria de se relacionar com mais alguém. Ela se fecharia para todos. E tudo por sua causa. Você que sumiu e nesse estado a deixou. Você morreu para ela, meu amor, e você sabe que nem precisa dizer que "acabou".
Já postei isso antes? :)
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terça-feira, 2 de março de 2010

Crise existencial

Tem gosto para tudo e eu não faço mais sentido. Eu me livro de tudo. Eu durmo sozinha. Estou ficando louca. As palavras se misturam. Pessoas me assaltam. Eu nem sequer resisto. Podem me levar. Não há quem se importe. (Há quem me roube?) Estou sozinha. Não há sequer o que assaltar. Será que eu ao menos existo?
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